quinta-feira, 26 de julho de 2012

'Ampliar policiamento em São Paulo seria aumentar as execuções sumárias'


Advogados e ativistas discordam de proposta do governador Geraldo Alckmin de aumentar contingente policial. Ministério Público irá pedir afastamento do comando da PM
'Ampliar policiamento em São Paulo seria aumentar as execuções sumárias'
Ato público do grupo Mães de Maio, em 2011, chama atenção 
 para a violência patrocinada pelo governo de São Paulo 
(CC/jornalpercurso.blogspot)
São Paulo – O número de homicídios dolosos no estado de São Paulo, segundo dados apresentados ontem (25) pela Secretaria de Segurança Pública, teve aumento de 8,39% em comparação ao primeiro semestre de 2011. Só na capital paulista houve crescimento de 21%. Uma onda de violência matou cerca de 200 pessoas em menos de dois meses no estado. Os assassinatos apresentam indícios de participação de grupos de extermínio formados, inclusive, por agentes públicos de segurança e são atribuídos por entidades de direitos humanos a um confronto entre a polícia e membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC).
Esta semana, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou que para reduzir os índices irá investir “fortemente em policiamento”. A medida, no entanto, é vista como equivocada por especialistas. “Aumentar o policiamento seria o mesmo que aumentar as execuções sumárias em um cenário de total descontrole da PM e dos demais setores da Polícia Militar. Em geral, esses grupos de extermínio atuam com a participação de agentes do Estado”, afirma o presidente da Fundação Criança e vice-presidente da Comissão Especial da Criança e do Adolescente da OAB, Ariel de Castro Alves.
O “descontrole” citado por Alves também será um dos argumentos para que o Ministério Público Federal (MPF) entre com uma ação civil pública pedindo o afastamento do comando da Polícia Militar de São Paulo e a intervenção federal no estado. Segundo o procurador da República Matheus Baraldi Magnani, em entrevista para o jornal O Estado de S. Paulo, a ação será apresentada hoje (26), durante audiência pública que reunirá diversos representantes da sociedade civil e de movimentos sociais para exigir medidas concretas para acabar com o “extermínio de jovens”, prática atribuída pelas entidades a policiais.
Rodolfo Valente, advogado da Pastoral Carcerária e membro do Instituto Práxis de Direitos Humanos, entende que o MPF precisa ir além. “Já é um passo. Mas entendemos que precisamos avançar muito. O governo do estado precisa ser responsabilizado, porque deu carta branca”, afirma, referindo-se à violência policial indicada pelos estudos. Ele aponta as declarações do governador como fatores que “acirram os ânimos da polícia contra a população”. Ele atribui a Alckmin a afirmação de que "bandido tem duas opções: ou é prisão, ou é caixão”.

Resistência seguida de morte

Para Valente, a opção ‘prisão’ já vem sendo amplamente usada pelo estado sem sucesso. No mesmo período em que o índice de homicídios aumentou em São Paulo, o número de prisões cresceu 9,65%. “Essa política de encarceramento está relacionada com esse extermínio”, afirma Rodolfo.
Já a opção ‘caixão’ é justamente a que as entidades que se reunirão hoje tentam frear. Para isso defendem a extinção dos registros de ocorrência como 'resistência seguida de morte' (RSM), 'auto de resistência' e análogos. Esse tipo de registro serve para afirmar que o assassinato cometido pelo policial foi em legítima defesa depois de o suposto criminoso reagir à voz de prisão.
O registro é tachado como uma “autorização para matar”, por Ariel de Castro Alves e pelo Mães de Maio – movimento que reúne ativistas, familiares e mães de algumas das vitimas dos assassinatos ocorridos entre 12 e 21 de maio de 2006, quando, segundo estudos, policiais mataram 493 pessoas em revanche à morte de agentes públicos de segurança, em ataques atribuídos ao PCC.
Ontem (25), Débora Silva Maria, líder das Mães, esteve no Palácio do Planalto, em Brasília, onde esteve com representantes do governo federal e entregou uma relação de ações para conter a violência, entre elas o fim do auto RSM.
“Antes que qualquer apuração seja feita se faz um pré-julgamento de que a morte ocorreu em legitima defesa. Muitas vezes os policiais andam com um ‘kit de resistência seguida de morte’. São armas 'frias' (sem registro) que são colocadas nas mãos do suposto agressor e disparadas para que depois conte no laudo residuográfico que o sujeito efetivou um disparo. Isso é inaceitável”, diz Ariel de Castro Alves.
Desde 2011, em função de pressões da sociedade civil, os casos de RSM em São Paulo deveriam ser investigados pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa, mas, segundo o integrante da OAB, as investigações no DHPP “cumprem apenas um protocolo e seguem o padrão do registro feito pelos policiais, são investigações viciadas”.
“Nós defendemos que esse registro, que é ilegal, seja extinto. Os crimes deveriam ser registrados como homicídio e a investigação diria se foi ou não legítima defesa. Acreditamos que a utilização da RSM é uma carta branca para que policiais matem e lhes seja garantida a impunidade”, afirma.
Um estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), apresentado no começo do mês, apontou que 62,5% da população não confia na Polícia Militar. A impunidade é apontada por Alves como uma das razões. “Se a população não confia na polícia dificilmente vai denunciar qualquer situação criminosa, principalmente a população que mora nas periferias”, aponta o advogado.
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