quarta-feira, 23 de maio de 2012

O julgamento do mensalão corre o risco de se tornar pouco mais que um acerto de contas.


Marcos coimbra

sociólogo e presidente do instituto vox populi
marcoscoimbra.df@dabr.com.br





O “julgamento do século”

Se os políticos da oposição o olham de longe, se a opinião pública pouco se interessa por ele, se seus efeitos em nosso sistema político são — por esses motivos — improváveis, em que sentido estamos na iminência do “julgamento do século”?

Embora as datas para o início efetivo do julgamento do mensalão ainda estejam indefinidas, o foco dos veículos da indústria de comunicação vai progressivamente se fechando nele. É como o período que antecede os grandes eventos de data marcada, como o Campeonato Mundial de Futebol, as Olimpíadas, o carnaval.

Antes escassas, as notícias ficam frequentes. O espaço a eles dedicado aumenta e enobrece. Saem os primeiros editoriais. Os comentaristas passam a tratá-los com regularidade; as colunas se enchem de notas e fofocas.

Algo assim está ocorrendo com a decisão que o Supremo Tribunal Federal vai proferir nos próximos meses.

Com mal contida expectativa, a mídia se prepara para o que parece considerar “o julgamento do século” — como ela mesma costuma designar situações e momentos que apresenta como transcendentais (o “casamento do século”, o “jogo do século”, a “luta do século” e por aí vai), mas que raramente têm o significado apregoado.

Na oposição institucionalizada, não encontramos esses sentimentos. Os principais partidos e as lideranças mais equilibradas apenas aguardam os acontecimentos, sem entusiasmo maior. Esperam algum lucro, mas desconfiam que os benefícios que poderão auferir são modestos.

Sabem que ninguém ganha, de fato, quando sobe a “taxa de desconfiança” da população em relação à política e aos políticos — desdobramento provável de uma eventual ampliação do interesse da opinião pública pelo julgamento. Embora não temam ataques diretos, não têm certeza se conseguiriam sair incólumes de um processo cujo controle lhes escapa.

Pelo que as pesquisas sugerem, o julgamento do mensalão tem, no entanto, pequena capacidade de se tornar, para a vasta maioria da sociedade, um fato de relevância maior.

Será possível devolver ao assunto a dramaticidade que tinha há sete anos e que perdeu? Será significativa a parcela da opinião pública que se dispõe a acompanhar a cobertura do julgamento nas semanas e meses que vai durar?

Talvez por isso, nas matérias dos últimos dias, estava clara a intenção de levar o Supremo a compactar procedimentos e reduzir prazos. É como se quisessem preparar um “evento de mídia” — suficientemente curto para prender a atenção popular (que todos admitem ser pequena) e com o máximo de “momentos dramáticos”.

Há alguma outra razão para aplaudir as sugestões de “liquidar tudo rapidamente”? Para defender mudanças nos trâmites usuais do STF? Mesmo as que contrariam a praxe do Tribunal?

Fala-se — como se fosse algo meritório — em suspender férias, reunir o plenário de manhã e à tarde, fazer sessões todos os dias. A única coisa para a qual se quer mais tempo é para a leitura da acusação do procurador-geral da República: da hora habitual, iria para cinco horas (intermináveis).

Não importa que vários ministros tenham que se dedicar, a partir do começo de julho, à Justiça Eleitoral — essa sim com prazos exíguos. Tampouco se alguns irão se aposentar em breve, deixando cadeiras vagas na corte. O “julgamento do século” é mais importante que tudo.

Se os políticos da oposição o olham de longe, se a opinião pública pouco se interessa por ele, se seus efeitos em nosso sistema político são — por esses motivos — improváveis, em que sentido estamos na iminência do “julgamento do século”?

Para os envolvidos, é gravíssimo. Sem falar no sentimento que muitos devem ter, de serem julgados sem ter feito nada de diferente da universalidade de seus pares. Do que são acusados, não escapa ninguém.

O julgamento do mensalão corre o risco de se tornar pouco mais que um acerto de contas. Uma (pequena) vitória para quem não gosta do “lulopetismo”. Uma vendeta quase pessoal.

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